sexta-feira, 8 de agosto de 2008

“Paris, Texas”: o estrangeiro de Wim Wenders

Um filme influenciado pela estética do pintor Edward Hopper não pode ser ruim. Autor do famoso “Nighthawks”, Hopper pintava os solitários: a mulher que acorda sozinha, os insones, o casal que senta junto no bar de madrugada, mas cujos cotovelos não se tocam. Foi inspirado na solidão habitual de alguns que Wim Wenders criou “Paris, Texas”.



Logo nas primeiras cenas do filme de 1984, o personagem se apresenta: Travis anda pelo deserto sem destino. Não há como não associá-lo à obra imortal de Albert Camus, “O Estrangeiro”. O livro de Camus é puro vazio existencial: exatamente como acontece em “Paris, Texas”: Travis tenta se preencher de todas as formas em sua reaproximação da vida convencional. Uma delas é descobrir como parecer um pai, quando é questionado se prefere parecer com um pai rico ou pobre. Rico, ele responde, como se pudesse comprar com isto o direito de parecer um pai.



A inexistência de emoções aparece tanto no filme de Wim Wenders como no livro de Camus: cada um à sua maneira, mas igualmente inadequados, os personagens vivem numa espécie de torpor. Tanto Mersault – de Camus – quanto Travis são indiferentes ao que o destino lhes reserva. O final de Wim Wenders, entretanto, se mostra mais beatnik que o de Camus: não lhe restando mais nada a fazer e tendo cumprido exatamente o que pretendia, Travis se entrega à sorte que lhe é inerente. A falta de perspectiva é que determina o destino do personagem, que, apesar disto, cativa o espectador.



Como se não bastasse tanto, o roteiro é assinado por Sam Shepard. Também ele empresta a alma beat de seus escritos para o filme, que é baseado num livro seu. Embora haja tanta solidão em “Paris, Texas”, o espectador é conquistado desde a primeira cena, o que faz com que não se revolte contra Travis no final. Um filme delicado sobre a não menos delicada natureza humana.


2 comentários:

Wilson Gasino disse...

Tem um lance que me intriga, que é a cena onde o Travis engraxa todos os sapatos da casa. O pé - no caso o sapato - tem uma simbologia muito forte. Mas eu não sei como interpretar isso. Ah, e eu gosto muito da música do Ry Cooder também.

CaldeiraMundi disse...

marip, dá uma olhada no meu novo post do blog... tem uma homenagem a você
bjo saudoso, apesar do bolo
mwhahaha
eu sou um poeta!