quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Monika e o desejo: a liberdade, por Bergman

a Daniel Oliva, que me ensinou a amar Bergman

Ah, os verões! Quem nunca tiver se rendido a um, que atire a primeira pedra. É essa a questão fundamental em “Monika e o desejo” (1953), de Ingmar Bergman: como podemos nos render ao que sabemos passageiro, fugaz, finito? A resposta, ou seja, como, talvez nem esteja no filme, mas é poder se render que está.

Para Godard, “Monika e o desejo” era o “filme mais original do mais original dos cineastas”. De fato, o filme se parece pouco com qualquer coisa que eu tenha assistido antes: poucas vezes vi alguém fazer cinema assim, tão livre. E não se trata de recursos de imagem, mas de história. Difícil mesmo é subverter os roteiros que guardamos na memória, sair do lugar-comum ao qual estamos acostumados. E é justamente isso que Bergman faz com maestria em “Monika e o desejo”.

A história começa como tantas outras: um rapaz e uma moça (a nossa Monika) se apaixonam e juntos, têm vontades de fugir e largar tudo. Largam. Vão viver distantes da sociedade, longe de seus trabalhos e famílias, como se só se pudesse ser feliz de verdade abdicando a tudo. É um tempo feliz, aquele, mas que acaba com o fim do verão. É quando o rapaz acorda e sente que “o dia está diferente” – como ele mesmo considera.

Mas “Monika e o desejo” é um filme sobre liberdade e outras questões que vão levar ao maio de 1968: a juventude chegando, os anseios de gente que até então não existia aos olhos do mundo e passa a existir. E tem desejos. Monika, a protagonista, ama somente os verões, os ventos que circulam livres, e então percebe que ajudou a erigir sua própria prisão. E desmonta tudo. Se o rapaz do filme pudesse ter-lhe dedicado um poema, seria o Epigrama nº 8, de Cecília Meireles:

“Encostei-me a ti, sabendo bem que
Eras somente onda.
Sabendo que eras nuvem, depus a
Minha vida em ti.

Como sabia bem tudo isso, e dei-me
Ao teu destino frágil,
Fiquei sem poder chorar quando caí”.



O mais embrutecido dos expectadores há de ficar atônito com “Monika e o desejo”. Pronto, não digo mais nada.