segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

“Noites tropicais”: Nelson Motta e a música brasileira


Depois de terminar de ler “Noites Tropicais”, de Nelson Motta, a sensação que dá é aquele clichê: “To be continued”. OK. Ninguém é louco de achar que a inspiração que rondava a época em que coexistiam Chico, Vinícius, Tom, Tim e outros ainda anda solta por aí. Não mesmo. Mas enfim, fico entre aceitar a idéia de Nelson de construir uma narrativa em primeira pessoa e rejeitá-la, já que li outros livros que falam exatamente da mesma coisa sem a mesma necessidade de tantos detalhes.

Falo, mais precisamente, de “Chega de Saudade”, de Ruy Castro, e “Tropicália”, de Carlos Calado, dois livros citados como referência bibliográfica de “Noites Tropicais”. Nenhum acontecimento em ambos os livros é isolado: tudo, exatamente como no livro de Nelson, está dentro de um contexto. De todos, o texto de Calado ainda é o melhor, na minha opinião: é o que flui, que chega ao fim quando menos se espera. Os dois, entretanto, explicam direitinho o que se propõem a explicar. Já Nelson, com a licença poética de quem escreve em primeira pessoa, se apropria de fragmentos das histórias dele com outras pessoas para tornar o livro mais comercial. Nisso, vejo a inserção do caso de amor dele com Elis, da paixão por ela que se revela do início ao fim do livro, de todas as outras mulheres que se tornaram apenas coadjuvantes na história de seu amor já tão comprometido com a escandalosa Elis. E Marisa Monte que é poupada todo o tempo: nenhum detalhe é revelado, nenhuma notinha na imprensa, como ele mesmo frisa, no início da carreira musical da pupila. Qual o critério de expor tanto uma e preservar tanto outra?

Não é que “Noites Tropicais” não informe. Informa, sim. Mas em alguns momentos, deixa lacunas. Porque se propõe a explicar tudo, não faz como Castro e Calado fizeram: um explica a bossa-nova; o outro, a tropicália. E embora estejam tão ligadas que não se possa ser purista, o outro movimento não-abordado entra subsidiariamente na história. Talvez tenha sido um pouco megalomaníaco pensar que em 453 páginas seria possível começar falando de João Gilberto e terminar com Titãs. É um tanto camoniano, no sentido de que “Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”. Mas se Nelson se permite ser tão eclético e abrangente, por que diminuir os sertanejos em vez de respeitá-los e simplesmente omitir as duplas? Talvez fosse mais sensato.

De resto, a leitura é fluida e agradável, além da vantagem que Nelson conta histórias muito bem – isso não se pode negar. Um livro imperdível para quem gosta de música.

domingo, 9 de dezembro de 2007

“Noel – poeta da vida”

Eu sei o título certo, antes que me corrijam: é “Noel – poeta da vila”. Eu sabia que o filme ia ser bonito (ou ao menos, esperava). Mas o que eu queria mesmo desde o início era uma canção só. Uma. Podia faltar tudo, menos “Um gago apaixonado”. Porque a gente não vai ao cinema só para analisar se o filme é bom ou não, mas também para se encontrar. E eu queria aquela música, só ela. E tive. Então não posso achar ruim.

Há quem vá dizer que achou a história de amor clichê, a la “A dama das camélias”. Eu adorei. Mesmo porque romance tem que ser assim mesmo, com protagonista, antagonista, aquela coisa toda, senão perde a graça. Achei tudo muito charmoso. A fotografia, os planos-detalhe, o roteiro (que tem participação de Jean Claude Bernardet...como não gostar?), a trilha.

Tem uma outra coisa que ando reparando cada vez mais nos filmes: uma frase inteira que resume tudo. E então, em “Noel – poeta da vila”, ela sai da boca de um de seus amigos. É algo assim: “É nisso que dá, não ser malandro o suficiente e se meter na arte marcial da bigamia. Esse daí tem que fazer um estágio de seis meses no morro”. O Noel do filme pulou a parte do estágio e foi lá, na arte marcial da bigamia, amar uma e viver com a outra, porque paixão quase nunca anda perto do juízo.

sábado, 1 de dezembro de 2007

“O mágico de Oz” e re-cordação


Outro dia, fui falar do Leão que queria coragem e fiquei na dúvida: era de “Alice no País das Maravilhas” ou de “O Mágico de Oz”? Era d´O Mágico. Tem dessas coisas que a gente esquece, aos pouquinhos. E algumas metáforas preciosas para a vida, que tornam o livro quase tão importante quanto “Pollyanna” (“Pollyanna moça” eu nem diria assim, tão indispensável: moças descobrem coisas sozinhas).

O que o livro de L. Frank Baum tem, além de Dorothy, Espantalho, Leão, Homem de Lata e Totó? Muita coisa. Começa pela cidade de porcelana (acho fantástico, babo mesmo): todo mundo, na verdade, é muito frágil. Lá, Dorothy aprende a grande lição: depois de vários consertos e muita cola, nunca a gente fica igual ao início. Outra, não menos dura, é que todo problema tem solução. E que, vez por outra, a gente tem que deixar algo que a gente ama para seguir em frente. É isso: seguir em frente talvez seja o maior recado do livro.

O resto é aquela idéia clichê de que recordar é passar de novo pelo coração, um deja-vu feliz, eu diria, de simplificar tudo: o mágico de Oz não é nada senão um homem pequeno com imaginação, e o que ele deu a todos eles (incluindo Dorothy, que já tinha o sapatinho), não era nada mais nada menos do que todos já tinham. Só fez lembrar. Re-cordar.